terça-feira, 27 de janeiro de 2009

O Indomado



“Falar de perdão é falar de Deus, é falar da graça, é falar da capacidade de oferecer aos outros uma memória apagada, sem registros, sem mágoas e sem as tatuagens do ressentimento.”
(Caio Fábio – Perdão: Encarnação da Graça)

Há uma ótima frase de Mário Quintana que diz: “Mas que susto não irão levar essas velhas carolas se Deus existe mesmo...”. Concordo com Quintana. Penso que muitos são aqueles que se habituaram somente com uma religião discursiva e vivem apenas um culto às normas. Deus é só parte do discurso religioso, e a idéia da divindade serve só para manter as convenções e convivências dentro de um âmbito de seguridade e compromissos. Ele é a Grande Punição, o supremo Não Pode, Não Toques, Não manuseies. É o Deus domesticado, estilizado e enquadrado à percepção pessoal. Sendo assim, já não é mais Deus, mas só um ídolo no altar das vaidades humanas.

O Deus das Escrituras é indomado, incomum, indescritível. C. S. Lewis em seu livro As Crônicas de Nárnia O apresenta como Aslam, o Leão. Segundo ele, quando, por fim, Aslam desaparece das festividades sem ninguém perceber, nenhuma pessoa fez qualquer comentário, pois todos se lembraram das palavras do Sr. Castor que já os havia avisado: “Ele há de vir e há de ir-se. Num dia, poderão vê-lo; no outro, não. Não gosta que o prendam... e, naturalmente, há outros países que o preocupam. Mas não faz mal. Ele virá muitas vezes. O importante é não pressioná-lo, porque, como sabem, ele é selvagem. Não se trata de um leão domesticado”. Cristo é o Deus com cara de Leão, indomável. Quem o conhece não se assustará, mas quem apenas o definiu como processo civilizatório e adequação às normas, sempre, ficará chocado com a Sua presença, maneiras e invencibilidade.

Que susto não irão levar aqueles que só pensam em Deus como sendo seu, ao descobrirem que Ele não pertence a ninguém, que está além de Sua própria criação, não podendo ser definido por qualquer tipo de nomenclatura, não podendo ser aprisionado aos juízos, regras e percepção terrenas. Ele não é o Deus do Cristianismo, do Judaísmo, do Islamismo ou de qualquer outro ismo, sistema ou estrutura. Ele é o Senhor dos céus e da terra, do mar e de tudo quanto há. O grande Eu Sou, o Filho encarnado, a essência da vida.

O susto será grande, pois com o Eterno a graça se manifesta. E ela é um fato intragável para todos os carolas. Como expressou maravilhosamente Philip Yancey em seu livro Maravilhosa Graça: “Graça significa que não há nada que possamos fazer para Deus nos amar mais (...) E a graça significa que não há nada que possamos fazer para Deus nos amar menos”. Espanta a muitos que Deus não nos trata segundo nossos merecimentos, mas segundo o Seu amor. É quando cremos no amor de Deus por nós, manifesto em Cristo, que deixamos de nos assustar com Ele e podemos, enfim, ver todos os abismos do medo sendo selados e todos os sustos sendo calados.

Roberto Montechiari Werneck

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