terça-feira, 27 de janeiro de 2009

Além da Solidão



“Ah quanta melancolia!
Quanta, quanta solidão!
Aquela alma, que vazia,
Que sinto inútil e fria
Dentro do meu coração!”
(Fernando Pessoa)

A solidão, a solidão... é um mar imenso, um soletrar sem eco nos vales de nosso trânsito neste mundo. Não a invocamos, mas em algum momento da vida ela se apresenta irredutível, indomável. Quando criança, é o berço escuro distante do colo e seio materno. Quando adultos, ela é a face inexorável diante do espelho embaçado do banheiro. Ela apenas é, quando de fato nos enxergamos como realmente somos, quando encontramos nossa real identidade, quando retiramos todas as fantasias e vemos o grande “eu existo”.

A solidão se mostra como o fato mais peculiar da história humana no cosmos, pois ela é simplesmente o reconhecimento de que seguimos, inalienavelmente, cada um o seu próprio caminho, sua própria história. E nesse caminho, nessa história, sempre ali adiante haverá uma bifurcação, uma escolha, que nos separará de alguém e nos aproximará ainda mais dessa nossa realidade existencial. Talvez, seja esse o grande trauma da morte, saber-se só. Esquivamos-nos dessa percepção, nos misturamos às massas de gente, elaboramos festas, vamos aos shows, fazemos os nossos rituais religiosos no intuito de minimizar essa falta, essa carência que somos. Pois somos apenas isso, nós mesmos na primeira pessoa do singular.

Mas a solidão pode se transformar numa busca. Encontrar-se com ela é receber o impulso que nos leva a procurar o próximo. Ela nos mostra que o grande “eu existo” é apenas um fragmento da existência total que inclui o outro e o grande Outro. Somente a dor da solidão essencial é que possibilita o reconhecimento que a vida que levamos é pouca, perto daquela que poderíamos ter.
Assim, quando ouvimos: “Hoje mesmo estarás comigo no paraíso” é que entendemos que a nossa busca foi concluída. Sartre disse que o inferno eram os outros. Mas Cristo afirma que não há paraíso na solidão. Céu é estar com Ele, e, também, é estar com pessoas humanas em um processo de des-solidão. Já é céu para aqueles que têm o seu ser misturado à divina presença e em um envolvimento de amor com os outros. A solidão, como condição essencial e existencial, só encontra a sua extinção em nós quando o próprio Deus, o grande Outro, em Cristo, faz morada em nosso ser e transforma nossa natureza para estarmos em unidade com o próximo. Nesse ato de Deus, somos recriados, os laços de proximidade são refeitos e o contato com o eterno se eterniza.

Fernando Pessoa poetizou sua solidão e enxergou-a cada dia maior e definitiva, ele escreveu: “Uma maior solidão / Lentamente se aproxima / Do meu triste coração”. Essa é a constatação poética da existência solitária que se encontra agonizante. Mas é possível ainda ouvir as palavras de Jesus que dizem: “Hoje mesmo estarás comigo no paraíso”.

Roberto Montechiari Werneck

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